sabato 5 marzo 2016

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É um erro tão banal que talvez nem merecesse um post: está errado porque a grafia certa é "deixe", com X. Contudo, ambos os sons representam uma chamada fricativa palato-alveolar (representada pelo símbolo /ʃ/) e a pessoa simplesmente não conhecia a grafia correta. Poderia-se mesmo dizer que, tendo que chutar uma grafia, CH foi uma boa escolha, por sempre ter este som em português (fora em palavras estrangeiras, como Bach), enquanto X pode eventualmente ter outros sons, como em "taxi" (onde representa duas consoantes, /ks/).

Quem tenha estudado linguística e fonologia histórica mais a fundo poderia até lembrar que o CH é previsível pelos cognatos em espanhol ("dejar") e catalão ("dexar") e pela relação com o latim "laxare", mas no fundo escrevemos com CH porque aprendemos que é a grafia certa.

martedì 1 marzo 2016

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Mais um caso para lembrar que uma letra não representa necessariamente o mesmo som: a grafia correta é "rara", mas engana-se quem achar que os dois R são iguais (em verdade, em praticamente todas as pronúncias nem mesmo os dois A representam o mesmo som).

Não temos como saber a pronúncia de quem escreveu, mas o fato da foto ter sido tirada em Pernambuco é um bom indicativo. O R em posição inicial é provavelmente um som produzido no fundo da boca, enquanto o segundo um som produzido mais para frente, provavelmente com alguma obstrução pela língua, talvez com um (ou mais) golpes no céu da boca. Inclusive por estar numa posição intervocálica, o segundo é presumivelmente mais "forte" que o primeiro. Se no caso da placa anterior o primeiro R foi apagado, indicando que a pessoa percebia a diferença entre os dois sons, neste caso não poderia apagar a consoante inicial da palavra. A solução para indicar a diferença foi grafar com dois RR, que não apenas costumam indicar um som diferente de R, mais representam visualmente esta maior força.

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Um caso de placa com erros ortográficos explicáveis: é o primeiro exemplo de algo que precisamos ter em mente: uma letra não necessariamente corresponde a um único som, e um mesmo som não necessariamente é representado por uma única letra. Há línguas com grafias mais regulares que o português, há línguas com grafias menos regulares, mas trata-se sempre de uma convenção que espelha, no melhor dos casos, a pronúncia mais comum de um certo grupo de falantes -- e, em muitos casos, a ortografia não espelha a pronúncia de ninguém, mas isto não é argumento para aqui. Outro fato que deve ser lembrado é que as pronúncias variam, e muitas vezes os erros de ortografia apenas tentam espelhar a pronúncia de quem escreve.

No caso dos R em "marcenaria", cabe notar que um deles está no final de sua sílaba, o outro no início: "maR" e "Ri" (ou, eventualmente, "Ria"). Nas pronúncias brasileiras, os dois sons são com frequência diferentes. Mais que isso, em certas pronúncias o primeiro nem é um som propriamente dito, mas uma mudança no som da vogal anterior. Apesar das variações regionais (e a geografia não é garantia plena sobre a pronúncia de quem escreveu a placa), a tendência brasileira é que o primeiro R seja um som mais fraco que o segundo, chegando às vezes a desaparecer. Ao perceber a diferença de intensidade entre os dois sons, é plausível que a pessoa tenha omitido, talvez inconscientemente, talvez conscientemente, o primeiro R: sob esta ótica, sua grafia é mais regular que aquela correta.

Quanto ao "en", cabe lembrar que nosso "em" vem do equivalente latino in, grafado con N assim como em praticamente todas as línguas indo-europeias (de fato, a palavra "original" é reconstruída justamente como *in). A origem do erro, alguns já devem intuir, está na vogal inicial, que ao longo da história do português mudou de I para E (sem entrar no âmbito das diferentes pronúncias para estas vogais, com a boca mais ou menos aberta, com os lábios mais ou menos arredondados, com a língua mais ou menos pra frente...). Nas pronúncias brasileiras, entre as quais a de Goiás, não se pronuncia a consoante seguinte como uma consonante bilabial (que, grosso modo, é pronunciada fechando-se com alguma força os lábios, como no som inicial de "mãe"), ou seja, o som que se associa com a letra "m". Isso acontece porque o E é pronunciado com a boca  mais aberta que o I, e fechar os lábios após a vogal implicaria em bem mais esforço: por causa da mudança na vogal, mudou-se também a consoante. Para a maioria das pessoas, essa consoante ou é produzida no fundo da boca, com lábios abertos, ou simplesmente se muda a vogal expressa pelo "e", nasalizando-a (ou seja, abaixando o velum, a parte mole no fundo do céu da boca, e fazendo o ar passar também pelo nariz). Na história do português, essa mudança de pronúncia foi representada graficamente de muitas formas: em alguns séculos com um til, em outros precisamente com um N, nos últimos tempos com um M (devido em parte a algumas pronúncias espécificas e em parte a certas ideias sobre regularidade na grafia). Contudo, este M é bastante arbitrário, sobretudo porque, como dito no início do parágrafo, não representa em nossa palavra o som que mais associamos com a letra M (aquele de "mãe"): a letra que mais se associa ao som é, precisamente, o N.